Vendo a lua ao contrário
Era o segundo questionário, em apenas algumas horas. O
primeiro fora mais simples, pôde ouvir a resposta dos outros e adivinhar as
perguntas: queriam saber seu grau de satisfação com os serviços.
Com o bilhete que informava “de 474 para 470” em uma mão, e
equilibrando a mala com a outra, foi possível dar o devido valor ao fiscal que
lhe dissera onde descer (inclusive indicando uma baldeação que lhe poupou 15
minutos) e reclamar da falta de espaço para mala (talvez não conseguisse
explicar, mas definitivamente ter que suspendê-la no pequeno espaço em cima dos
bancos não era boa ideia).
O tom, o contexto, o local - tudo faz diferença na conversa.
Perguntavam agora sobre sua vida. Melhor não criar caso, estava feliz por não
ter precisado de tradutor. Horas depois, lhe perguntariam de novo, mas com a
ressalva de que era apenas curiosidade, que poderia não haver resposta.
Assim, com discrição, ouviu parte da vida da outra pessoa, a
que não se importava com a sua resposta. A outra, antes, que a tudo anotava,
quis saber a sua religião. Não ter não era uma possibilidade – lhe foi
atribuída uma. O espanto foi tanto que nem deu tempo de tentar revidar e usar a
intérprete.
Perplexidade porque o óbvio ali não acontece. Perplexidade
também pela obviedade do estranho. Depois, em uma vila sem trânsito, a briga
entre carrinhos no supermercado. Onde não há dificuldade, os humanos as criam.
Chegar em casa às 18hs é qualidade de vida? E se a única
opção for chegar em casa até às 18hs? Pontualidade é importante, sem dúvida – principalmente quando o ônibus só passa a cada
2 horas.
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