Volta e meia jovens simpáticos oferecem abraços na Av.
Paulista. Li que se trata de um movimento internacional. Não consegui aderir à
causa, talvez por parecer mais uma gaiatice do que um proposta séria, por
atrapalhar o fluxo de pessoas nas cada vez mais estreitas calçadas ou porque já
vi moradores de rua sendo ignorados sem constrangimento mútuo. Também pode ser
que eu esteja sendo injusta, caso eles - além da Av. Paulista - tenham também
asilos, orfanatos e prisões como destino de suas manifestações. O tempo dirá.
Ontem havia mais de cem manifestantes, todos uniformizados
com a t-shirt da campanha. Faziam bastante barulho e no farol vermelho abraçaram
um ônibus. Transmitiam alegria, sem dúvida. Uma moça pediu-me para que
aceitasse abraçá-la, pois ela estava com frio.
Mesmo sendo contra esmolas, cedi. Sim, pois o aquecimento permitido
pelo abraço de um pulôver é tão efêmero quanto a ajuda dos abraços ofertados
pelos manifestantes. Seria essa a origem de meu ceticismo, a superficialidade
da solução apresentada? A menina friorenta mudou minha percepção quanto ao
movimento: são os manifestantes que precisam do abraço, não as pessoas que têm
pressa para chegar em algum lugar e acabam aceitando-o.
A grande conectividade virtual tem mantido as pessoas
simultaneamente em contato e afastadas. É possível que a convivência com
computador, telefone e televisão, mais do que com pessoas, acabe por criar
pretextos para reuniões: abraços, hobbies – ao invés de manter o convívio como
algo natural. Com o discurso de ajudar ao outro, pessoas estão pedindo socorro;
por isso não há preocupação em saber quem é o público externo ou em alterar o
status quo dos considerados auxiliados. Décadas atrás os jovens estariam
reunidos para discutir a leitura de clássicos e propor alternativas ao mundo. Hoje,
se há discussão, é on line, cada um de sua casa. Essa pode ser uma das
contradições pós-modernas que levaram a campanha a oferecer abraço ao invés de
pedir; sua necessidade é admitida de forma reflexa.
Outra possibilidade para meu ceticismo é distorção do que se
entende por conquista. Comemora-se, por exemplo, a aprovação no vestibular. Só
que vestibular é uma confirmação de um comprometimento com os estudos, comprometimento
que deveria permanecer após a aprovação. É a convivência com a faculdade e com
o estágio que garante o diploma ou a oportunidade de outra carreira – não o
vestibular. Profissão todo mundo vai ter uma, conviver bem com ela é o fator relevante. Mas se o diploma for considerado conquista,
algo pronto e acabado, eis mais um medíocre no mundo.
Reconheço, lógico, que há momentos marcantes – insisto apenas
que a celebração é o convívio. A assinatura de uma escritura é um marco, mas
celebrá-la é não deixar o imóvel fechado e desocupado. Assim como o primeiro
encontro só tem a sua importância quando muitos o sucedem.
Abraçar é querer e permitir, não é um toque instantâneo ou
automático como o faz a alegre campanha. Quem quer abraçar precisa se estruturar,
conhecer quanto seus braços sustentam e como caminhar estando eles ocupados –
antes de fazê-lo. Afinal, como bem me lembraram hoje, não se pode abraçar o
mundo com as pernas.
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