quinta-feira, 10 de maio de 2012

Você quer um abraço?

Volta e meia jovens simpáticos oferecem abraços na Av. Paulista. Li que se trata de um movimento internacional. Não consegui aderir à causa, talvez por parecer mais uma gaiatice do que um proposta séria, por atrapalhar o fluxo de pessoas nas cada vez mais estreitas calçadas ou porque já vi moradores de rua sendo ignorados sem constrangimento mútuo. Também pode ser que eu esteja sendo injusta, caso eles - além da Av. Paulista - tenham também asilos, orfanatos e prisões como destino de suas manifestações. O tempo dirá.

Ontem havia mais de cem manifestantes, todos uniformizados com a t-shirt da campanha. Faziam bastante barulho e no farol vermelho abraçaram um ônibus. Transmitiam alegria, sem dúvida. Uma moça pediu-me para que aceitasse abraçá-la, pois ela estava com frio.

Mesmo sendo contra esmolas, cedi. Sim, pois o aquecimento permitido pelo abraço de um pulôver é tão efêmero quanto a ajuda dos abraços ofertados pelos manifestantes. Seria essa a origem de meu ceticismo, a superficialidade da solução apresentada? A menina friorenta mudou minha percepção quanto ao movimento: são os manifestantes que precisam do abraço, não as pessoas que têm pressa para chegar em algum lugar e acabam aceitando-o.

A grande conectividade virtual tem mantido as pessoas simultaneamente em contato e afastadas. É possível que a convivência com computador, telefone e televisão, mais do que com pessoas, acabe por criar pretextos para reuniões: abraços, hobbies – ao invés de manter o convívio como algo natural. Com o discurso de ajudar ao outro, pessoas estão pedindo socorro; por isso não há preocupação em saber quem é o público externo ou em alterar o status quo dos considerados auxiliados. Décadas atrás os jovens estariam reunidos para discutir a leitura de clássicos e propor alternativas ao mundo. Hoje, se há discussão, é on line, cada um de sua casa. Essa pode ser uma das contradições pós-modernas que levaram a campanha a oferecer abraço ao invés de pedir; sua necessidade é admitida de forma reflexa.

Outra possibilidade para meu ceticismo é distorção do que se entende por conquista. Comemora-se, por exemplo, a aprovação no vestibular. Só que vestibular é uma confirmação de um comprometimento com os estudos, comprometimento que deveria permanecer após a aprovação. É a convivência com a faculdade e com o estágio que garante o diploma ou a oportunidade de outra carreira – não o vestibular. Profissão todo mundo vai ter uma, conviver bem com ela é o fator relevante. Mas se o diploma for considerado conquista, algo pronto e acabado, eis mais um medíocre no mundo.

Reconheço, lógico, que há momentos marcantes – insisto apenas que a celebração é o convívio. A assinatura de uma escritura é um marco, mas celebrá-la é não deixar o imóvel fechado e desocupado. Assim como o primeiro encontro só tem a sua importância quando muitos o sucedem.

Abraçar é querer e permitir, não é um toque instantâneo ou automático como o faz a alegre campanha. Quem quer abraçar precisa se estruturar, conhecer quanto seus braços sustentam e como caminhar estando eles ocupados – antes de fazê-lo. Afinal, como bem me lembraram hoje, não se pode abraçar o mundo com as pernas.

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