O show do ano. Saiu mais cedo do trabalho e foi para a fila.
Tablet numa mão, celular conectado em outra, poucas pessoas na sua frente.
Levou cartão e uma falsa carteira de estudante – mas se descobrissem a
maracutaia ou se o sistema saísse do ar, tinha dinheiro para os dois ingressos.
Em um outro bolso, troco para o lanche e pó de guaraná.
Faltavam 6 horas para começar a venda dos ingressos pela
Internet, 14 para a bilheteria abrir. Nada desanimava, foram meses engordando –
a poupança e o banco de horas – só para poder viver esse momento. Deu certo. Um
par de ingressos Pista VIP e alguns novos amigos. Despediu-se com a promessa de
acampar dois dias antes da abertura dos portões: VIP, para ser VIP, tem que
grudar a barriga na grade!
Os dias foram passando e a tensão aumentando: até conseguiu
uma barraca iglu emprestada, mas percebeu que não tinha amigos. Pelo menos não amigos
companheiros o suficiente para acampar do lado de fora do estádio ou usar o
horário do almoço para recolher o material de acampamento.
Só não entrou em depressão porque isso faria com que
perdesse o show.
Foi então que ficou sabendo do Zé. O Zé topava todas – e cobrava
barato. Também era esperto. Ficou acertado que o Zé acamparia na fila. Levaria
uma companhia para ficar mais fácil da fila compreender a troca: 2 por 1. Em
pagamento receberia o equivalente a um ingresso mais as refeições. O Zé não
comia fast food, mas isso ele não disse – demonstrando experiência no assunto,
exigiu receber comida caseira e farta, para poder dividir não só com o seu affair
mas também com os companheiros de fila.
Ajuste feito, a ansiedade permanecia. E se o Zé não fosse
confiável? Se aparecesse alguém oferecendo mais? Se ele simplesmente
abandonasse o acampamento? Não, não seria possível. Tudo daria certo, estaria
entre os primeiros a entrar. Estava calor, sentiria sede. Como não ir ao
banheiro? Mesmo que ficassem guardando o seu lugar, quem daria passagem para retornar? E se
tivesse que sair do lugar, do que adiantaria investir no Zé, no VIP?
Algo precisava ser feito. E rápido. Lembrou-se, então, das
fraldas de uso adulto. Por que seriam apenas geriátricas? Fez um test-drive.
Funcionou. Parecia um short, mas a visão do volume na bunda era horrível. Treinou
olhares blasé para situações de mão boba. Conseguia agora entender a moda das calças
saruel.
Por precaução, quando chegou o dia D, no melhor estilo
adolescente, amarrou um moletom na cintura. O Zé cumpriu o combinado. Só não
foi dos primeiros 100 a entrar por causa da fila preferencial de grávidas e de melhor
idade. Dançou, gritou, cantou, não perdeu nenhum detalhe – tudo sem ninguém na
sua frente.
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