Os vaidosos que me perdoem, mas liberdade é fundamental
Tudo começou com um fim: o da henna em pasta que comprei há
mais de 2 anos. Na época, fiquei em dúvida sobre qual cor de cabelo passaria a
ter. Foram várias as simulações com foto. Vários os vídeos vistos sobre os
cuidados e as diferenças entre os produtos do mercado. Quanto maior o rol,
maior a insegurança – ficar dependente de cabeleireiro, por mais que eu goste
da minha, com quem corto há 12 anos, nunca!
No fundo, no fundo, a tonalidade que eu mais gostava era a
que estava fazendo questão de deixar de existir. Adoro as mechas aleatórias com
que o sol me presenteia – e as artificiais não resolveriam "meu problema". Foi
então que encontrei uma embalagem feita de material reciclável que afirmava não
apenas ser 100% natural (Vegan), mas que também era compatível com qualquer
outra química.
Em dia estratégico, um antes de cortar o cabelo (se não
desse certo teria a quem recorrer), estreei o produto. Nas instruções, grata
surpresa: o fabricante avisava que era possível, ao invés de cortar a ponta do
tubo, desenroscá-lo, de forma que duraria mais de uma aplicação. Praticamente
ninguém percebeu a mudança e a ausência dos fios brancos, o que me animou mais
ainda.
Agora que a embalagem esvaziou, estou com dificuldade em sua
reposição. Espero que não tenha sido a honestidade do fabricante o motivo do
desaparecimento na prateleira. A moça da loja queria me convencer de levar outro
produto, até que eu estava gostando da ideia de mudar de cor, mas quando ela
falou que achava que 3 caixas seriam suficientes para uma aplicação que em 1
mês no máximo deixaria evidente a raiz aparecendo, desisti.
Na volta, uma senhora entrou correndo no vagão do metrô em
que eu estava. Quando mostrei o lugar vago, que eu deixara de sentar, ela ficou
olhando para os lados. Ainda ofegante, explicou que não gostava de sentar de
costas, que também não gostava de entregar os pontos, apesar da idade – já que com
o espelho não tinha o que fazer. Quando lhe disse que beleza era uma convenção,
ela apenas sorriu.
Foi então que me surgiu a frase do título. Do que adiantaria
a vaidade se não tivéssemos liberdade para exercê-la? Mas será que há realmente
liberdade na construção da aparência que permitimos os outros verem? Convenções
são sempre tão relevantes quanto o posicionamento que tomamos em relação à sua
adesão – não haverá certo ou errado somente se houver liberdade.
Certa vez questionaram-me o motivo de eu não ter tatuagem. A
pessoa queria se convencer de que minha decisão era consequência de falta de
coragem, não de preferência estética. Deixar o corpo da forma como ele veio ao
mundo, sem alterar cor, forma, formato também é uma modalidade de vaidade:
menos convencional e certamente mais livre.
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