quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Os vaidosos que me perdoem, mas liberdade é fundamental

Tudo começou com um fim: o da henna em pasta que comprei há mais de 2 anos. Na época, fiquei em dúvida sobre qual cor de cabelo passaria a ter. Foram várias as simulações com foto. Vários os vídeos vistos sobre os cuidados e as diferenças entre os produtos do mercado. Quanto maior o rol, maior a insegurança – ficar dependente de cabeleireiro, por mais que eu goste da minha, com quem corto há 12 anos, nunca!

 

No fundo, no fundo, a tonalidade que eu mais gostava era a que estava fazendo questão de deixar de existir. Adoro as mechas aleatórias com que o sol me presenteia – e as artificiais não resolveriam "meu problema". Foi então que encontrei uma embalagem feita de material reciclável que afirmava não apenas ser 100% natural (Vegan), mas que também era compatível com qualquer outra química.

 

Em dia estratégico, um antes de cortar o cabelo (se não desse certo teria a quem recorrer), estreei o produto. Nas instruções, grata surpresa: o fabricante avisava que era possível, ao invés de cortar a ponta do tubo, desenroscá-lo, de forma que duraria mais de uma aplicação. Praticamente ninguém percebeu a mudança e a ausência dos fios brancos, o que me animou mais ainda.

 

Agora que a embalagem esvaziou, estou com dificuldade em sua reposição. Espero que não tenha sido a honestidade do fabricante o motivo do desaparecimento na prateleira. A moça da loja queria me convencer de levar outro produto, até que eu estava gostando da ideia de mudar de cor, mas quando ela falou que achava que 3 caixas seriam suficientes para uma aplicação que em 1 mês no máximo deixaria evidente a raiz aparecendo, desisti.

 

Na volta, uma senhora entrou correndo no vagão do metrô em que eu estava. Quando mostrei o lugar vago, que eu deixara de sentar, ela ficou olhando para os lados. Ainda ofegante, explicou que não gostava de sentar de costas, que também não gostava de entregar os pontos, apesar da idade – já que com o espelho não tinha o que fazer. Quando lhe disse que beleza era uma convenção, ela apenas sorriu.

 

Foi então que me surgiu a frase do título. Do que adiantaria a vaidade se não tivéssemos liberdade para exercê-la? Mas será que há realmente liberdade na construção da aparência que permitimos os outros verem? Convenções são sempre tão relevantes quanto o posicionamento que tomamos em relação à sua adesão – não haverá certo ou errado somente se houver liberdade.

 

Certa vez questionaram-me o motivo de eu não ter tatuagem. A pessoa queria se convencer de que minha decisão era consequência de falta de coragem, não de preferência estética. Deixar o corpo da forma como ele veio ao mundo, sem alterar cor, forma, formato também é uma modalidade de vaidade: menos convencional e certamente mais livre.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

(A) A espera

Na linda e ensolarada tarde, cumpria o dever exercendo seu privilégio de dia útil praticamente livre.
 
O reflexo do vidro que lhe protegia do sol mostrou ao seu lado um senhor organizando papéis de propaganda política.
 
Sem qualquer juízo de valor, percebeu que não sabia o posicionamento dos atuais candidatos em relação à inspeção veicular ambiental.
 
Recebeu mais um adesivo e foi embora. Será o último?

terça-feira, 21 de agosto de 2012

A sedução das promoções ou como uma cafeteira pode provocar questionamentos quanto a ausência de preconceito em relação ao desconhecido.

Comprei uma cafeteira elétrica. Já faz algum tempo, é verdade. Se não contei antes é porque pressenti a história que estava por vir.

Tudo começou em uma promoção, não da cafeteira – mas do cartão de crédito: a cada comprovante de compra acima de determinado valor um brinde seria dado. A foto era linda! Fui ao posto de troca e conclui que o brinde também era.

Passei alguns dias esperando a vontade passar. Nada. Na minha lista de objetos de desejo, nenhum com valor próximo à compulsória compra. Lembrei-me, então, do supermercado – comprar comida não seria exatamente um desatino.

No dia em que a fatura do cartão fechou, conferi se ainda havia brindes a serem distribuídos e fui ao supermercado. O carrinho ficou cheio, aproveitei muito boas promoções, mas o valor necessário estava longe...

Foi então que o locutor anunciou a cafeteira. De marca desconhecida, made in China, ela custava aproximadamente 8 embalagens de coador de papel – e não precisava deles para funcionar. Uma pechincha.

Esquivei-me do vendedor do eletro e passei todas as compras no mesmo cupom fiscal. Extrapolei cinco centavos do valor necessário, mas não peguei a nota fiscal, documento imprescindível para a garantia.

Brinde trocado e vários cafés depois, a cafeteira passou a vazar água. Coloquei-a na caixa e voltei ao supermercado. A funcionária avisou-me que se o mês tivesse mudado, ela não conseguiria emitir a nota fiscal e eu ficaria sem garantia alguma (será que o Procon sabe desse procedimento?) Bem, saí de lá com uma cafeteira nova, que durou até ontem, quando começou a vazar água.

domingo, 19 de agosto de 2012

Mirada

Pelo o que eu entendi, paranoia é listar de forma contínua diversos motivos para um determinado fato – praticamente um antídoto ao tédio. Por questões antagônicas, paranóicos e entediados paralisam em seus escolhidos momentos.
Eu tenho convicção de que nada é por acaso. Ampliar o acaso: observar ações, reações e omissões (próprias e alheias) parece-me mais divertido e produtivo do que construir porquês. Percebo também que são apenas diferentes profundidades a partir da superfície conceituada como vida.
Boiar, nadar, mergulhar; com ou sem corrente: uma escolha. Tanto faz. É possível que um dia precipite o que nos impede de enxergar o fundo ou a margem, margem ou fundo que podemos fugir ou procurar mergulhando, nadando, boiando. Também é possível que sejam os nossos olhos, fazer o quê?
No intervalo da Oficina de Psicanálise, exatamente em um particular período de escolha entre firme propósito ou gratidão e oportunidade, ganhei encadernação do SESC com a extensa programação do festival internacional de teatro em Santos. O enredo de algumas peças tem ligação direta ao que estudaremos – apesar de serem eventos independentes. Acaso? Quem compra o ingresso em São Paulo ganha o ônibus até o evento (ida e volta, lógico- mas mediante prévio agendamento). Será mais uma decisão a ser tomada...

D+ informações no sescsp.org.br/mirada.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Sobre a vida


Se na vida acontecesse extamente o que imaginamos, a fantasia não teria lugar - nem as surpresas.

Dizem que antes de nos submetermos à limitação da matéria, estabelecemos o que iremos fazer com o corpo físico que ganharemos.

É feliz quem cumpre o combinado, pois ao seguir a sua natureza terá condições de enfrentar o que vier.

Quanto maior a influência externa, maior a tendência de haver dificuldades.

É viver para ver (e não ver parar crer).

* * *

Apesar de escrever com inspiração em acontecimentos vividos, textos lidos e representações assistidas, dentro do possível tenho evitado manifestar-me na forma de aconselhamento, apesar de algumas consultas que volta e meia aparecem. É algo natural em nossa cultura perguntar a opinião dos outros. O que não percebemos, muitas vezes, é que em toda afirmação há percepções e valores de quem responde, os quais podem ser bem diferentes de quem pergunta - apesar da afinidade existente.

Por vaidade, talvez, a preferência seja provocar o outro a manifestar-se, ao invés de assumir as escolhas como próprias e correr o risco da censura.

Incertezas e medos existem muito mais por causa dos outros do que por nós mesmos. Exercitamos o pensar e somos instigados a falar o que raciocinamos a partir de parâmetros ensinados; esquecemos que a origem e a finalidade está no sentir.

Sentir-se bem é a única resposta possível. Se algo incomoda, é o impossível que está sendo vivido. Por que quem já atingiu o impossível esquiva-se do possível ainda não sei - mas não dá para responsabilizar a vaidade por tudo.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Suicidar-se

- Sinceramente, alguma vez você leu ou ouviu falar de alguém que tenha cortado os pulsos após doar sangue?

- Que ideia!

- Você vem me falar de respeitar a opção do suicida e não consegue sequer me escutar – e olha que o raciocínio é simples - quando não se quer mais um objeto, ou uma roupa, o primeiro impulso não é colocar para dar? Reciclamos até embalagens...

- Sim, e daí?

- Se alguém realmente não quer mais o seu corpo e sabe que em algumas horas ele será pó ou comida de vermes, o razoável não seria distribuí-lo para quem muito precisa?

- Ah! Você acha que o cara vai pensar...

- Tá, você acha que jogar-se na frente do metrô é um mero impulso, sem prévia reflexão. Se ele pensasse nos outros, pelo menos na família e nos amigos que provavelmente sentirão sua falta, ele não se matava.  É por isso que eu insisto ser o suicídio uma demonstração de egoísmo.

- Lá vem você de novo...a pessoa precisa de ajuda.

- Concordo, apesar dessa ser uma contradição sua: se você respeita a decisão do outro, não há no que ajudá-lo, basta respeitar. Pense bem: o viver é um conviver após o outro. E conviver é deparar-se com as diferenças e nossas limitações. Não há limites para o egoísta, há apenas ele e o seu querer. O suicida é o cara que não consegue participar da festa, apesar de estar nela: não dança aguardando sua música favorita nem pede outra música para o DJ; espera ser servido, e é capaz de amargar fome a servir-se de outra comida porque o garçon não aparece; interage dando ordens e se ouve as pessoas é mero acaso. Ele prefere desligar a chave geral, sem se importar se há ou não um gerador: se não consegue se divertir do jeito que ele imagina que os outros conseguem, ele se vinga acabando com a festa de todos.

- Exagero considerar o suicídio uma vingança.

- Há casos e casos, certamente, mas se não for vingança é raiva de sua incompetência em seguir em frente. Para mim, as tentativas de suicídio existem para o suicida poder ver a reação das pessoas, o quanto elas se subordinarão às suas vontades, o que tornaria a vida suportável a ele. Não é que deseje a morte, o que ele quer é o mundo que imagina e não existe. Só vou convencer-me de que se trata de uma decisão madura quando antes de morrer o cara resolver doar não apenas sangue, mas um rim, um pulmão e uma córnea.

- Credo!

- Por quê? No mínimo vai dar um tempinho a mais para decidir se é o que ele quer mesmo e, se mudar de ideia, vai estar no lucro – pior é só arrepender-se quando estiver do outro lado. O tormento é mais do espírito do que do corpo, tirar o corpo não deve alterar muito a realidade. Podemos mudar não apenas o que queremos como os ambientes e pessoas com as quais convivemos: tem lugar para todo mundo no planeta, mas depois que saímos dele, ninguém sabe se, quando, e em que condições vai voltar.

sábado, 4 de agosto de 2012

Respirar é para o amor. Transpirar, para o trabalho.

O semáforo acabara de abrir e ela recuou da sarjeta para a calçada. Estava com febre, ansiosa e dispersiva, tentando compreender aquele momento. Ainda não sabia o que pensar. O sinal continuava verde para os carros que não existiam na rua. Correu. Cansou-se. Respirar é sempre, o transpirar apenas acompanha.