sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Antes da Janta

Três mulheres e um homem. Cada um fez o seu pedido após certa indecisão frente ao caixa. Isso eu não vi, mas deve ter sido assim. Percebi-os sentados nestas mesas em que um dos lados é grudado na parede, dois sofás em cada lado. Conversavam monossílabos aguardando a senha do painel anunciar que o prato estava pronto.

 

Os números foram chamados em sequência, com algum espaço de tempo entre eles. Levanta, levanta, fica em pé, senta e senta. Decide em qual canto da bandeija vermelha ficará a garrafa verde da cerveja. Senta, levanta, senta. Decide como equilibrar a garrafa verde de cerveja e faz igual, dentro da sua bandeija vermelha. Levanta, levanta, fica em pé, senta, muda de lugar, senta e senta.

 

Murmurinho e ninguém come. As quatro verdes cervejas iguais. Ninguém bebe. Sentado do lado contrário à parede o homem estica o braço segurando o celular. Todos sorriem para a foto.

 

- Quer que eu tire? - Perguntei.

- Não, obrigado. É selfie mesmo.

 

As garrafas se enconstam. Nova foto. Um come do prato do outro, antes do seu. Caras e bocas que dariam ótimas fotos. A minha também. Trocaram a receita e tive que insistir para ganhar o copinho de pimenta. Mexicano com maionese? Não peço mais.

terça-feira, 12 de agosto de 2014

Transporte Público - a grama verde do vizinho, já que nele é refresco.

Desde o  primeiro dia percebi que precisava escrever sobre transporte público. Foram tantos os sustos (com este e outros assuntos) que só agora consigo organizar as ideias - pena que boa parte já estou esquecendo. Logo que cheguei, no aeroporto, providenciei o ticket de trem. No bilhete, ao invés de estações ou cidades, números. Nenhum horário, mas "válido a partir de + hora e data da compra". A sorte foi ter ido no guichê (depois soube que custava 2 Euros a mais, mais de 10% de acréscimo se comparado com a máquina que só aceita notas de até 20 euros). Tivesse eu comprado na máquina, não conseguiria chegar onde passaria o trem, nem identificaria o seu horário. Onde pensei que fosse, ninguém sabia se o próximo trem era o meu - muito menos consegui ler o nome que constava na frente do primeiro vagão; quando fui conferir no mapa já estava me confundindo com as cidades próximas. Subi tão confiante que bastou sentar para me pedirem informação, pois o som que informava conexões estava inaudível. No segundo trem (houve conexão) pediram para que eu respondesse pesquisa de satisfação do cliente, avisei que estava chegando naquele momento, mas o funcionário disse-me que precisava entrevistar todo mundo. Consegui dizer que considerava importante ter o fiscal dentro do trem, reclamar da falta de espaço para bagagem, mas esqueci de reclamar do que muito veio a me atrapalhar: as estreitas escadas para subir e descer dos vagões.
Qnt a mais vc pagaria para subir essas escadas?
Meses depois, acredito ter entendido a lógica: O ICE (alta velocidade) e o Intercity (que permite reservar lugar) são os trens que os turistas pegam e praticamente não atrasam. Depois há os regionais (mais de um Estado, mas com curta distância) e os locais. Os locais, que param em todas as bibocas, não têm primeia classe nem escada - e há muito espaço para rodas (bicicletas, cadeirantes e andadores). Peguei o local uma vez - o suficiente. O trecho que fazia em 50 minutos no regional durou mais de 3 horas no local. Nem dá para dizer que ele ande mais devagar, que seja possível ver melhor a paisagem, a diferença é o tempo em que ele fica parado nas principais estações e o fato de parar em todas. Atraso é a regra nos trens regionais e locais. Alguns fazem piada sobre isso, mas não chegam a reclamar. Dependendo do trecho e do horário, é tão lata de sardinha quanto o nosso transporte na hora de pico, com o peculiar detalhe de que nós somos mais limpinhos. No dia em que vim embora vi um ICE em Mainz, indo a Hamburgo, tão lotado que desejei poder voltar outro dia para saber se era sempre assim, ou conhecer mais o idioma para perguntar o motivo de tantos engravatados contorcidos entre andadores e bicicletas.

O fato é que os estudantes só usam o trem no trecho em que não pagam (a matrícula na faculdade dá direito ao transporte que passa em frente ao campus), os outros trechos são feitos de carona (praticamente não usam ônibus que não seja de linha - e mesmo o de linha nunca sabem o preço ou por onde passa). Fiz minha inscrição no Blablacar, site de caronas coletivas que foi recomendado e, um dia antes da viagem, quem ia me dar carona cancelou porque havia batido o carro e estava no hospital. Não tentei uma segunda vez. O discurso é ser ecológico, um carro com 4 pessoas é melhor do que 4 carros na estrada, pode ser mais divertido (você tem que colocar o quanto gosta de conversar, se aceita ouvir música e se fuma) - tem o mesmo poder de convencimento das explicações de que não há crise no país ante tantas pessoas procurando garrafas plásticas nos lixos ou das etiquetas vermelhas "Frisch" avisando que o produto in natura é fresco.


Bombeiros correram para debaixo da aeronave antes da foto
Na volta (Lufthansa), houve overbooking que não chegou a atrasar o voo. Após decolarmos, fomos informados de que havia um problema na asa do avião e teríamos que retornar. Foram três horas dando voltinha para despejar combustível (ainda estou em dúvida se escrevo perguntando se houve compensação deste impacto ao meio ambiente). Durante o dia eu ficaria radiante, acho linda a vista dos alpes suíços. A cena da chegada foi igual a dos filmes. Nos deram hotel, mas ainda não compreendi a diferença de tratamento entre os passageiros (eu ganhei taxi e não fui informada que haveria janta, quem chegou no ônibus fretado, uma hora depois, jantou). Foram 4 horas de sono e novo embarque. Fila para marcar a conexão. Mesmo avião, ninguém arrumou ou limpou, e uma passageira passou mal. Médicos vieram, ela desembarcou, as malas foram loclizadas - 1:15 aproximadamente testando nossa educação. Depois, forte turbulência em todo território brasileiro, de 3 a 4 horas. Não consegui comer o lanche e o comissário fez questão de recolher o pratinho em que eles estavam - desci da aeronava fazendo malabarismos. Nem passei no freeshop, tinha 50 minutos para o próximo voo. Só que este não era um dia para ser fácil, no eterno Galeão o desembarque é no 1º andar e o embarque no 3º: dos 4 elevadores, só 2 funcionavam - sempre dando prioridade aos cadeirantes. Especificamente, uma senhora alemã subiu e desceu enquanto eu esperava. No Brasil tudo deu certo, furei a fila, o funcionário nem percebeu que eu só tinha direito a um volume e deixou eu despachar 2, o voo saiu na hora e, até agora, não entendi porque o taxi que me deixou em casa acrescentou 3 reais ao taxímetro, após 30 horas de viagem resolvi nem questionar para chegar logo em casa.

* * *
 

As fotos das obras não ficaram boas, eis um breve resumo: o verão é a única época em que é possível fazer obra. Se planejar errado tem que esperar o ano seguinte, logo tudo para em função da obra - que só acontece em horário comercial. Em Freiburg, o cruzamento principal no centro da cidade, onde é possível fazer conexão das 5 linhas de tram, estava fechado. Você desce e tem que adivinhar onde a linha que você estava continua. Até tem placas e mapas, só que estão com etiquetas e pichações. Evite a cidade até outubro se não quiser ficar carregando mala/mochila. Em 3 meses, na estação de trem do campus, foi instalado um novo trilho e colocado letreiro e auto-falante. Cheguei com 2 e fui embora com 3 plataformas. No final, a estação de trem seguinte começou a ser reformada e, com isso, colocaram ônibus para fazer a ligação entre as estações e encurtaram a linha, obrigando-me a fazer uma baldeação para chegar em Frankfurt. O pior, no entanto, é que tem menos ônibus do que trem, quem não sabia (a maioria franceses) fica esperando mais de hora pelo ônibus. No dia que voltei das férias cheguei à noite, chovia muito e o pessoal, sem reclamar, saiu na chuva e ficou esperando no ponto do ônibus pelo menos 46 minutos. Tenho dúvida se aqui as pessoas aceitariam tão fácil essa condição.